Happy Killer

30 de janeiro de 2016 § Deixe um comentário

Fiquei de cama por quatro dias esta semana. E ainda não me sinto 100%, mas não aguento mais ficar parada. Assisti a filmes, documentários, entrevistas e reportagens, todos que me vieram à cabeça. Como não temos televisão em casa, por opção, sou eu mesma que seleciono a programação pela internet. Existe praticamente tudo pra se ver de graça, então com um bom bloqueador de anúncios e de pop-ups, somos felizes. Não nos expomos a propagandas irritantes, ignoramos o que se passa no mundo do consumo. E acima de tudo, nos sentimos no poder de escolher a programação, de acordo com o dia e com o nosso humor. Li sobre gentrificação, a África do Sul, a explosão da Zika no nosso continente, e um pouquinho do meu livro, mas muito pouco.

A gripe dessa semana foi de causa múltipla. Teria vindo conosco do Brasil? Seria dengue, quem sabe? (chegara há apenas cinco dias do Brasil). Fomos a uma performance no sábado (‘All you can eat’ na Villa Ockenburg com Dick El Demasiado, demais mesmo!) onde dançamos muito, com muitos amigos, num espaço apertado e suamos muito também. Para nos refrescar, tínhamos que sair ao relento e fazia muito frio. No dia seguinte dois amigos caíram doentes. Eu não.

Mas segunda à noite fui a uma aula de ginástica que eu já sabia ser fatal, ‘Happy Killer’, assim como é chamada, na minha problemática academia de ginástica alternativa, ‘Gymnastiek Fabriek’. Sempre quis e sempre quero malhar, mas minha disciplina tem sido muito errática. No inverno é difícil. E troco qualquer ginástica por uma boa sessão de dança ou uma longa caminhada, ou até mesmo um jogo de basquete (este, pudera, tem ocorrido numa média de uma vez a cada cinco anos!).

Tinha enfiado na cabeça que devia malhar mais, malhar muito, todo dia, para ficar em forma forever. O ‘Happy Killer’, como o nome sugere, é uma aula intensa, com saltos, flexões, agachamento, tudo muito rápido e repetitivo, música alta, levantando uns alteres aqui e ali. Tudo que soa bem chatinho e cansativo e realmente o é. Parava os exercícios no meio e quase vomitei o jantar. Ao que a instrutora, por sua vez, absolutamente fora de forma e pra lá de gorda, me perguntava “Você está bem?”, “Vamos lá, Ludmila!”.

Cheguei em casa em transe, obstinada em mergulhar no sofá e com meu computador no colo desaparecer. No dia seguinte ainda me forcei a levantar, comprar um remédio anti-gripe e ir ao trabalho. Às 13h fui liberada pra voltar pra casa, qual era a minha cara de doente. Voltei de lá diretamente pra cama e assim fiquei por dias. Mike cuidou de mim como pôde, fez suco de laranja, cozinhou, e também caiu doente dois dias depois. Ele teve febre, eu não.

No dia da febre dele eu pude ajudar um pouco mais, já era o terceiro dia, meu, doente. Uma amiga trouxe-nos sopa, frutas e pão em casa. Na Holanda não existem farmácias que entregam em casa. Então tive que sair às 21h pra comprar um remédio pra baixar a febre do Mike. Ele tinha que ir a Londres no dia seguinte!

Não me lembro de ter essa experiência há muito tempo, de tanta dor misturada. Era uma combinação dos músculos moídos pela ginástica, com a dor de garganta e nos olhos, da gripe. A tosse tão penosa, corroía o peito, a cada tossida. Não tinha remédio, além do regular (líquidos, vitamina C, própolis), tinha que esperar o corpo trabalhar contra o vírus. Depois desses dois dias na cama,  vi que estava reagindo quando me levantei da cama sem muita dificuldade. Ainda que com algumas dores, consegui lavar a louça. Os olhos demoraram mais, e ainda dóem, quatro dias depois.

Lembro de uma gripe assim (eu devia ter uns doze anos, não sei), em que pra eu olhar de um lado pra o outro, a parte interna dos olhos era puxada por uma dor lancinante. Sempre lembro dessa sensação, como a expressão máxima da gripe. Se é gripe mesmo, não sei, um exame poderia atestar. Mas essa dor nos olhos é como eu reconheço se meu estado é grave ou não.

De alguma forma a condição de “enferma”, dolorida e rendida, sem capacidade de dar alguns passos pra preparar algo na cozinha, me fizeram um tanto mais consciente do meu próprio corpo. Cada músculo dizia alguma coisa, os ouvidos estalavam e a traqueia queimava com a tosse. Tinha que mudar de posição na cama e não encontrava uma sequer que fosse confortável. Os dedos doíam, como apoiar a cabeça que caía pra um lado, enquanto eu tentava assistir a este ou aquele filme? Vi ‘Avatar’ pela primeira vez, vi Sí Se Puede (excelente filme sobre o conflito urbano entre os cidadãos espanhóis versus os bancos) entre outros.

Enfim, não volto mais pra essa aula de ginástica, penso. Tenho que buscar as formas mais gentis de cuidar do corpo. E mais, nesse final de semana, Mike em Londres, tenho que juntar forças pra fazer minha declaração de renda, urgentemente. Entro em pânico, pois eles vem cobrando cada vez mais de mim, que queria tanto comprar um computador novo. E tenho que encontrar outras formas de me manter financeiramente também, sem o dissabor que é, a ocupação de fazer design gráfico para pessoas de péssimo gosto. (O resto desse post é desabafo, ecos de uma auto-reflexão de inverno.)

Quero tantas coisas ao mesmo tempo e não consigo me concentrar. Vejo todo mundo ao meu redor mais perseverante, mais responsável, mais realizado do que eu. Provavelmente uma leitura superficial dos outros e uma injustiça que faço comigo mesma. Em novembro apresentei um trabalho legal, que pode gerar novos frutos. Fomos ao Brasil. Uma pausa em tudo. Bastante longa talvez, me senti tão longe de tudo e de volta às confusões familiares, que são tão improdutivas. Ouço as reclamações deles e mentalmente também os critico, e me pergunto se realmente precisamos ser assim.

Volto do Brasil cheia de ideias, de planos. Caio doente. Sinto-me atrasada… A casa está uma bagunça. A lista começa a ficar pesada. Hoje estou querendo tirar um pouco desse atraso. Tantos são os meus planos pra mim e também com Mike, mas tanta dispersão! O Mike sim, está bem e organizadíssimo. Culpo a minha falta de tempo ao trabalho como designer num escritório que não admiro, e por isso também a falta de concentração. A existência desses ‘outros’ trabalhos, menos meus que de outros, que geram pouca grana e grande frustração. No momento administro sites de umas quatro pessoas também… Estou lendo pouco e produzindo nada. Desenhos, instalações, performances, workshops. Todos acontecendo dentro da minha cabeça, incubados. Esse ano eu preciso lançar tudo de novo no mundo.

Marvin Minsky

24 de janeiro de 2016 § Deixe um comentário

Marvin Minky faleceu domingo passado, aos 88 anos.

Marvin Minsky at MIT 1968

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