Estado de alerta

13 de abril de 2016 § Deixe um comentário

Se por um lado é bom viver numa Holanda civilizada e segura, por outro, vê-se cada vez mais policiais fazendo a ronda nas ruas, nos bondes e nos trens. Antes não haviam catracas para se pegar um trem, hoje se vêem novas catracas sendo instaladas em quase todas as estações.

Os controladores de bonde eram normalmente funcionários uniformizados simplesmente  com a camisa da operadora de transportes, a HTM. Hoje eles vestem coletes policiais e vez por outra estão à paisana.

A sensação que dá é que a segurança também custa a nossa tranquilidade. Em Haia, convivemos cada vez mais com a vigilância ostensiva de policiais a pé, de bicicleta, a cavalo e de carro. O centro da cidade é praticamente uma área sitiada. A única opção no espaço público é de exercermos o nosso papel de consumidores. Enquanto compramos estamos livres e assegurados.

Seguimos tranquilos. “Quem não deve não teme”, é o que se pensa. E assim perdemos nossa privacidade e nossa capacidade de nos governarmos. Na Holanda, praticamente qualquer atividade em espaço público deve ser antes notificada e autorizada pelo estado. Toda manifestação, performance de rua, campanhas dos mais diversos fins, todas devem receber antes o aval da polícia. Tornaram o que era direito em algo sujeito a permissão e a repressão.

Ainda por cima, neste clima nórdico, de temperaturas inóspitas, a arquitetura e o mobiliário urbano não incentivam a vida pública. Pouquíssimos são os bancos de praça, onde algumas pessoas às vezes se sentam para aguardar alguém na rua ou papear no telefone celular. Nesse país em que chove dia sim, dia não, também não há marquises – gentilezas urbanas – para se abrigar da chuva e do vento.

Em Haia, alguns problemas urbanos foram e são resolvidos de forma inteligente. Tirou-se o tráfego de veículos do centro, privilegiando o transporte público, os ciclistas e os pedestres. Cada vez mais os estacionamentos são enterrados, construídos abaixo do nível da rua, o que realmente proporciona qualidade de vida. Mas o que dizer dos arranha céus do centro? Parece que estão forjando uma nova imagem da cidade, onde os edifícios de escritórios tomam conta da paisagem. Quantos edifícios vazios, que não podem mais ser ocupados, pois a lei dos squats foi substituída pelo ‘anti-squat’? Aluguéis baratos, em lugar das antigas ocupações que até pouco tempo atrás eram legítimas. Ninguém jamais ficou sem casa.

A mensagem que se passa é a de que o cidadão não é bem vindo. Somos todos suspeitos. Enquanto se fala em ‘crise dos refugiados’, como se fosse um problema ‘dos outros’ lá longe no Oriente Médio, do lado de cá da Europa Ocidental, jovens são recrutados pelo extremismo pseudo-religioso, gerando uma preocupação legítima com o terrorismo. Enfim, estamos todos sob controle, para o nosso próprio bem.

Esta solução é uma forma de repressão “passiva”. Mais vigilância, menos possibilidade de convivência das diferenças, menos gentilezas urbanas (ah, é, as lixeiras também são cada vez mais escassas, pois “podem facilmente servir de repositórios para explosivos” usados por terroristas urbanos, por exemplo). Não se resolvem as questões mais essenciais, que seriam a da justiça social, do fim das intervenções no Oriente Médio por parte de americanos e seus aliados europeus e mais integração social.

Mas os europeus seguem seus caminhos tranquilos. O problema é dos outros.

PS.: Enquanto escrevo isso, uma gigantesca crise política e econômica se desencadeia no Brasil. Parte por um processo de recessão que já estava anunciado e parte por um cisma político que coloca a presidência em xeque. A sociedade mais dividida do que nunca, de forma maniqueísta e simplista. Como se fosse uma luta entre os ricos e pobres, direita e esquerda. Mas todos corruptos.

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